Cargueiro de grande porte transpõe o Canal de Rio Grande, passando entre os molhes leste e oeste (Bruno Farias, 2011) |
"A ferrovia das pedreiras
Por: Bruno Martins Farias (2009)
A dificuldade para a entrada de
barcos grandes na barra de Rio Grande já foi um problema bastante falado em
diversos relatos históricos. O texto "Molhes da barra: História e construção da identidade comunitária", de autor desconhecido, fala em apenas dois metros de profundidade. Já Manoel Jordão da Silva,
que fez uma das primeiras medições conhecidas de profundidade no canal, em 1698, achou “185 palmos de fundo” - aproximadamente quatro
metros. E no ano de 1721 o capitão-mor Simão Pereira de Sá escreveu para o
governador das Capitanias do Sul dizendo que até então nenhuma sumaca grande
teria entrado no dito porto, mas que a partir daquele momento poderiam fazê-lo
com um bom prático – na ocasião foram colocadas balizas de madeira com
cataventos que mostravam a direção e a velocidade do vento. Nesse novo
batimento do canal, foram constatados entre 2,5 e três braças, o equivalente a
entre 5,5 e 6,6 metros
de profundidade.
Porém o problema ainda estava longe
de ser resolvido, e perdurou durante muitos anos mais - só uma dragagem no
canal de Rio Grande feita no século XX é que foi permitir a chegada de barcos
grandes ao porto de Pelotas. Em 1790, 69 anos depois da medição feita por
Manoel Jordão da Silva, o capitão-mor Domingos Alves Branco Moniz Barreto
voltou a falar na periculosidade da Barra de Rio Grande e nos “bancos mudáveis
de areia”, conforme demonstra Guilhermino César em seu livro “Primeiros
Cronistas do Rio Grande do Sul”. Diversos relatos posteriores a esse falam das
tentativas de se acabar com os bancos de areia móveis do canal. Um capitão americano tentou desobstruir os bancos de areia do canal no
ano de 1863 arrastando no fundo do mar uma grade, puxada por um rebocador. Já
em 1875, um engenheiro inglês sugeriu a construção de um novo porto em Torres. E mais tarde, em
1882, um oficial da marinha chegou até a tentar abrir passagem com
torpedos.
Tendo em vista o fato de que com essa instabilidade toda seria impossível a entrada de barcos grandes no porto, o engenheiro hidráulico Honório Bicalho teve em
Em 1890, o governo estadual tentou fazer
sozinho os quebra-mares com pedras trazidas da cidade de Itapuã, a 260 quilômetros
dali. Quinze anos mais tarde, em 1905, um grupo de investidores
norte-americanos desistiu do mesmo projeto. Até que, entre 1908 e 1910, a Compagnie Française du Port de Rio Grande do
Sul acabou de uma vez por todas com o problema: a empresa construiu uma
ferrovia para buscar em Capão do Leão e em Monte Bonito as
rochas que hoje fazem parte dos Molhes da Barra dos dois lados do canal.
Cipriano
Sainz, de 88 anos, foi um dos funcionários responsáveis pela manutenção dos
guindastes e das locomotivas que transportavam o granito até Rio Grande. Ele,
que está para completar 35 anos de aposentadoria, entrou para a pedreira em
1938 e foi um dos encarregados de desmontar e transportar a locomotiva Maria
Fumaça que se encontra hoje em
São José do Norte. “O
porto de Rio Grande tinha uma fundição capaz de produzir qualquer engrenagem
que a gente precisasse” conta. Saudosista, Sainz se recorda de quando trabalhou na empresa:
“Na época éramos 230 funcionários. A
maioria dos companheiros se aposentou, foi embora ou morreu”.
- Mapa da ferrovia das pedreiras (Compagnie Française du Port du Rio Grande) |
De
acordo com Joaquim Dias, no blog “Capão do Leão: Cultura & História”, a
ferrovia descia do Cerro do Estado “até a
sua junção à ferrovia Rio Grande-Cacequi, na altura da Vila Teodósio. (...)
chegou a iniciar-se uma ponte ferroviária sobre o Arroio Padre Doutor, a qual,
citam os antigos, ainda se vêem as pilastras às margens, não muito longe da
zona urbana”. É o caso de Éder Rosa, morador da Vila Teodósio: ele é um dos
leonenses que sabem onde ficam os restos da ponte e afirma que ainda existem no
município uma locomotiva e outros maquinários usados, na época, pelas
pedreiras. Mas, apesar da importância dessas máquinas e dessa via férrea para o
desenvolvimento econômico da região Sul do Brasil, elas hoje estão paradas,
quando poderiam estar sendo usadas em benefício dos cidadãos leonenses como meio
de transporte ou como atração turística. [...]".
Ilustrações:
- Cargueiro de grande porte transpõe o Canal de Rio Grande,passando entre os molhes leste e oeste (Bruno Farias, 2011)
- Mapa da barra de Rio Grande mostra as profundidades da passagem e os bancos de areia submersos (Bartholomeu Dias Paes)
- Mapa da barra de Rio Grande mostra as profundidades da passagem e os bancos de areia submersos (Bartholomeu Dias Paes)
- Mapa mostra a entrada da esquadra portuguesa em Rio Grande em 1776, as posições das tropas e os bancos de areia submeross na barra (s/a, 1776)
- Busto de Honório Bicalho (Foto de Bruno Farias - 2011)
- Molhe leste, em Rio Grande/RS (Foto de Bruno Farias - 2011)
- Trecho da ferrovia das pedreiras em Capão do Leão/RS (Foto de Bruno Farias - 2009)
- Guindastes das pedreiras de Capão do Leão/RS (s/a, s/d)
- Mapa da ferrovia da Companhia Francesa (Compagnie Française du Port du Rio Grande)
- Locomotiva usada no transporte das pedras para a construção dos molhes (Foto de Bruno Farias - 2011)
- Guindastes das pedreiras de Capão do Leão/RS (s/a, s/d)
- Mapa da ferrovia da Companhia Francesa (Compagnie Française du Port du Rio Grande)
- Locomotiva usada no transporte das pedras para a construção dos molhes (Foto de Bruno Farias - 2011)
O estaleiro de Rio Grande/RS é tão alto que pode ser visto de diversas
partes da cidade, e até de São José do Norte/RS (Bruno Farias, 2011)
Navios de grande porte cruzam a barra da Lagoa
dos Patos rumo ao Oceano Atlântico (Bruno Farias)
A antiga estação de trem de Capão do Leão/RS hoje é usada como
Casa de Cultura do município (Bruno Farias); Foto da época
da construção dos molhes de Rio Grande/RS (Google Imagens)
Imagens); tetrapodes de concreto hoje substituem os enormes
blocos de granito usados originalmente nos molhes (Bruno Farias)
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