quinta-feira, 14 de junho de 2012

Túnel próximo ao antigo casarão do coronel Alberto Rosa, em Capão do Leão/RS, pode ser uma paleotoca

O que muitos moradores acreditam ser uma passagem subterrânea feita por mãos humanas 
na verdade pode ser a toca de algum animal gigante pertencente à megafauna


Por: Bruno Farias (14/06/2012)

O interior do suposto túnel se assemelha muito com uma paleotoca, o que
poderá ser confirmado por pessoal especializado (Foto de Arthur Victória Silva)

Alguns moradores de Capão do Leão/RS costumam falar sobre um suposto túnel existente nas proximidades do já demolido casarão que pertenceu ao coronel Alberto Rosa, sócio do Coronel Pedro Osório na firma Pedro Osório & Cia, que durou até 1922. É comum ouvir pessoas que afirmem já terem visto ou até entrado no tal buraco que, até o momento, teria origem desconhecida. Conta-se que a misteriosa passagem subterrânea teria vários de metros de profundidade. "Quem já entrou conta que o túnel acaba em um poço" afirma Joaquim Dias, professor de história formado pela UFPel, ávido pesquisador do passado leonense e autor do blog "Capão do Leão: História e Cultura".

Antiga sede da Estância da Palma, em Capão do
Leão/RS (www.imagenshistoricas.blogspot.com)

Segundo o pesquisador leonense Arthur Victória Silva, autor das fotos do túnel e do blog "História  de Capão do Leão/RS": "O pessoal da Palma acredita ser um túnel de fuga pois ele vai em direção às casas. Tem mais de um túnel. O outro está bem desmoronado. Cada tunel vai para uma direção diferente" recorda Silva. Já o músico Éder Rosa, também morador de Capão do Leão/RS, acredita que a estrutura seria um túnel que provavelmente iria até esse casarão, mas que hoje está interrompido. Algum tipo de rota de fuga escavada, pelo qual ele conta ter entrado até aproximadamente 30 metros de profundidade. Mas mesmo sendo tão comentado pelos habitantes locais, até o momento o local permanecia desconhecido para a ciência.

O professor de história Joaquim Dias posa pra foto junto
à entrada do suposto túnel (Foto de Arthur Victória Silva)
Porém, em janeiro de 2012, Dias e Silva foram até a Estância da Palma, que hoje pertence à Universidade Federal de Pelotas, e saíram em busca do suposto túnel relatado pelos moradores. Apesar de não terem entrado no buraco, o que poderia ser considerado algo muito arriscado devido ao risco de desabamentos e de falta de oxigênio, entre outros perigos, eles tiraram fotos que podem ajudar a avaliar a verdadeira natureza da reentrância. "Este da foto, a gurizada da Palma entrou e foi até perto de uma árvore. Aquele cano preto que aparece nas fotos, eles colocaram para drenar a água. Tem muito barro dentro do túnel e acredita-se que ele tivesse a altura de uma pessoa" reproduziu Silva. Porém a passagem subterrânea pode remontar a um passado muito mais distante do que crêem os curiosos que ali já estiveram: ela se assemelha às antigas tocas de animais pré-históricos que existem em outros municípios do Rio Grande do Sul. 

Representação antiga de um mamute (Fonte: Google Imagens)

Duas fotografias do local foram então enviadas para o paleontólogo da UFRGS Heinrich Frank, do Projeto Paleotoca: "Parece muito com uma paleotoca, conheço ocorrências muito parecidas", compara Frank. O pesquisador já havia desvendado os rumores sobre um outro suposto "túnel" ou "caverna" existente em Porto Alegre/RS, próximo ao prolongamento da Av. Bento Gonçalves, que ele avaliou através de fotos e matérias de jornal antigas e descobriu ser também uma toca de algum animal pertencente à megafauna, que viveu há aproximadamente 10 mil anos atrás. Algumas espécies dessa época se assemelhavam muito a outras que existem atualmente, tendo como principal diferença as grandes proporções. Exemplos disso eram a preguiça gigante, também conhecida através de lendas indígenas como "mapinguari"; e o tigre dente-de-sabre, entre outros. O tatu gigante, por exemplo, podia ter aproximadamente o tamanho de um carro; e o mamute colombiano tinha as proporções aproximadas de um ônibus.

Pesquisador estuda uma paleotoca em outro município - essas
estruturas não costumam ter formato retangular, como o túnel
 existente em Capão do Leão/RS (Foto: Projeto Paleotocas)

Porém ainda restam dúvidas quanto a essa questão. Frank estranhou uma característica do suposto túnel que o faz diferir das paleotocas conhecidas na região: "estranhei o formato ´retangular` desse túnel (retângulo em pé). Pode ser erosão devido à água que corre na toca ou realmente cavou alguma coisa lá. Aquela foto do teu blog está um pouco ´retangular` demais para uma paleotoca. Mas enfim, deve ter paleotocas em toda região, é mais provável que seja uma paleotoca" teoriza o pesquisador. Infelizmente, uma avaliação desse tipo é muito difícil de ser feita exclusivamente através de fotos. E a distância dificulta a vinda até o local de pessoas com conhecimento técnico o suficiente para resolver esse mistério de uma vez por todas.

A verdade, assim como o túnel e como os restos mortais do
Cel. Alberto Rosa e família, jaz no subsolo (Foto: Bruno Farias)

Seria o buraco uma paleotoca reutilizada por antigos habitantes do local como rota de fuga? Ou  um verdadeiro túnel cavado pelo ser humano? Quem sabe seria simplesmente mais uma confusão gerada pelo imaginário local que, repetida por diversas e diversas vezes, acabou se tornando uma suposta "verdade", como já aconteceu tantas vezes em outros lugares? De qualquer forma, a versão de que o buraco seria um túnel de fuga continua valendo entre os moradores. Luiz Teixeira é um deles: "Eles são, de fato, criados por mãos humanas. Meus familiares moraram lá quando ainda o local era dos Rosa, e atestam a criação dos túneis como sendo, realmente, rota de fuga, considerando que haviam escravos na fazenda e a região estava sempre em conflito. Sobre o poço, ele é bem mais recente, e acabou sendo feito bem no meio do percurso do túnel, que levava até o antigo casarão" acredita Teixeira.


Visualizar Casarão do Coronel Alberto Rosa em um mapa maior

Teixeira enviou inclusive um desenho no qual mostrou o percurso dos dois túneis: um deles saindo da senzala em direção ao leste e indo até as imediações do açude; e o outro saindo das mesmas imediações em direção ao sul e indo até uma parte mais baixa do terreno, num mato. "Meu pai tem 60 anos, e ele quando pequeno conhecia e entrou nos dois túneis (a casa do vô ficava logo atrás do casarão) até suas respectivas saídas, e confirmou que ambos tinham uma boca dentro da casa - de acordo com ele, uma era na antiga senzala, anexa à construção"

Descrição do prédio escrito em 1994 por Zênia De León e reproduzido no blog de Arthur Victória 
Silva (Fonte: www.capaodoleao.blogspot.com)

Levantamento histórico e arquitetônico da construção reproduzido por
Joaquim Dias (Fonte: http://capaodoleaohistoriaecultura.blogspot.com.br)

Nos trechos da descrição do prédio feita em 1994 por Zênia De León  reproduzido no blog de Silva não é  mencionada a existência de nenhum túnel  de fuga sob a casa de Alberto Rosa, assim como na parte do levantamento histórico e arquitetônico do prédio de 1982 reproduzida por Dias. Tampouco se tem notícias de que o suposto caminho subterrâneo tenha sido descrito cientificamente por um paleontólogo ou um arqueólogo. Devido à falta de provas escritas referentes à construção do túnel, e à inexistência de um laudo técnico que comprove a possibilidade dele realmente ser uma paleotoca ou mesmo um túnel feito pelo homem, até o momento fica difícil afirmar qualquer coisa a respeito. Seria essa polêmica mais um daqueles casos nos quais a cultura conservada oralmente supera o conhecimento acumulado pela ciência e pela história até então? Precisaremos aguardar mais algum tempo pra saber... 

(Matéria atualizada em 18/06/2012)

4 comentários:

  1. Me chamo Luiz Teixeira e também estava com o Prof. Joaquim e Arthur na ida à Palma. Na verdade, eu que indiquei a existência dos túneis e os levei até lá. Eles são, de fato, criados por mãos humanas. Meus familiares moraram lá quando ainda o local era dos Rosa, e atestam a criação dos túneis como sendo, realmente, rota de fuga, considerando que haviam escravos na fazenda e a região estava sempre em conflito. Sobre o poço, ele é bem mais recente, e acabou sendo feito bem no meio do percurso do túnel, que levava até o antigo casarão. De qualquer maneira, é quase impossível se tratar de uma paleotoca. Mas valeu por levantar a questão. É sempre bom divulgar locais de Capão do Leão.

    ResponderExcluir
  2. Prezado Luiz,
    Reproduzi tua opinião na reportagem, assim como outras informações obtidas após a publicação da primeira versão dela.
    Um abraço,
    Bruno Farias (Jornalista, especialista em História Social)
    http://www.historiaxatualidade.blogspot.com.br

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Caro Bruno, valeu por reproduzir as informações que te passei. Seria uma boa, mesmo, enviar paleontólogos e profissionais afins. De qualquer maneira, quando voltarmos lá tenta te fazer presente, será uma honra contar com a tua presença.

      Excluir
  3. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

    ResponderExcluir